terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

De quando os coronéis não querem largar o osso. Ou SOS futebol brasileiro.

No último domingo, dia 19.02, tivemos a realização da quinta rodada do Campeonato Paranaense de futebol e nela, um jogo histórico: o clássico Atletiba(Atlético PR x Coritiba) de número 370, pela primeira vez na história, não teria transmissão na TV, mas sim no Youtube. Os clubes, insatisfeitos com os valores oferecidos pela RPC(afiliada da Rede Globo no estado e detentora dos direitos de transmissão do campeonato) decidiram se unir, negociaram com o YouTube e decidiram abrir a transmissão na internet, via streaming, pra qualquer pessoa que quisesse assistir. A transmissão ocorreria pelos dois canais oficiais dos clubes no YouTube, contaria com narradores e comentaristas dos dois times, além das equipes atuantes no gramado, com as câmeras, repórteres de campo e todo o aparato necessário. Um marco, não é?!

Seria...se algo de muito estranho não tivesse acontecido. Na volta do seu aquecimento no gramado, o árbitro Paulo Roberto Alves Jr foi alertado pela supervisora de imprensa da Federação Paranaense de Futebol, Julia Abdul, que profissionais de imprensa não credenciados estariam no campo de jogo e que a partida não deveria ser iniciada enquanto essas pessoas não fossem retiradas. A questão é que ESSES PROFISSIONAIS SERIAM OS RESPONSÁVEIS PELA TRANSMISSÃO DO JOGO. A partir daí começou o imbróglio. Times que subiam e desciam do vestiários, presidentes dos clubes em campo conversando com a arbitragem e com o delegado da partida, diretores de marketing do Atlético-PR e até o próprio técnico Paulo Autuori se mobilizando pra que ninguém da imprensa deixasse seus lugares, narradores e repórteres que já estavam ao vivo sem entender nada e, principalmente, um público de mais de vinte mil pessoas nas arquibancadas que pagou ingresso tendo seu direito de assistir à partida desrespeitado. 

Presidentes dos clubes tentam, inutilmente, convencer o árbitro a iniciar a partida.

Depois de quase 40 minutos de incerteza, diante da irredutibilidade do árbitro, as equipes voltaram ao gramado, deram as mãos no círculo central, saudaram a torcida e voltaram definitivamente ao vestiário. Fim de jogo. Começo do problema. A federação se isentou, dizendo que a autonomia de parar a partida era do árbitro e que a presença de profissionais não credenciados feria o regulamento do campeonato(Aqui vale ressaltar que jogos menores do Paranaense de 2017 passaram pelo mesmo problema de pessoas não credenciadas no campo de jogo e as partidas não foram interrompidas). O árbitro, em sua súmula, pôs a culpa nas duas diretorias dos clubes que, segundo ele, impediram a retirada dos não credenciados de campo. Os clubes já se pronunciaram dizendo que não jogarão mais a partida(remarcada para o próximo dia 01/03, quarta-feira de cinzas), além de anunciarem que entrarão na justiça contra a Federação do estado. 

Uma imagem pra ficar na história: rivais unidos por um ideal maior.

A questão é clara. Todo esse texto pode ser resumido em algumas linhas: os clubes decidiram desafiar o poder vigente - CBF, Federações, Rede Globo e suas afiliadas - por se acharem prejudicados quanto ao valor oferecido por seus produtos(o jogo de futebol, a exibição de suas marcas, etc). Buscando o que é melhor para si, se uniram e adotaram uma tendência que já é realidade em outros mercados: a negociação individual de suas cotas de transmissão. Agora, resta saber quais serão as cenas dos próximos capítulos. O contra-golpe da CBF foi rápido: em congresso técnico para discutir a realização do Campeonato Brasileiro de 2018, a entidade anunciou que não mais aceitará estádios cujos campos sejam de grama sintética, pois 'prejudicam o nível técnico do espetáculo'. Adivinha quem tem grama sintética - inclusive aprovada pela FIFA - em seu estádio? O Atlético-PR.

Por fim, a nós, torcedores, amantes do esporte, que ansiamos por um futebol brasileiro mais profissional, que valorize o fortalecimento dos times, sua autonomia e especialmente que priorize o torcedor, resta lutar contra essas estruturas arcaicas que nos impedem de evoluir. Apoiar iniciativas como essa de Atlético-PR e Coritiba é fundamental. Chega de mandonismos. O futebol brasileiro não tem dono. Enquanto não superarmos esse modelo nefasto de administração do futebol local no conluio CBF/Federações/Rede Globo, todo dia será um novo 7x1.       


  

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Harry Pottker e o enigma do amadorismo


Essa semana chegou ao fim - e com desfecho inesperado - uma das negociações mais arrastadas da pré-temporada do futebol brasileiro. William Pottker, um dos artilheiros da edição do Brasileirão de 2016 com 14 gols ao lado de Diego Souza, teve sua contratação desistida por parte do Corinthians, com o qual sua equipe, a Ponte Preta, havia fechado um acordo verbal.

Pottker em ação pela Ponte Preta

O imbróglio se deu por conta da participação de Pottker na partida da Ponte contra o Campinense, pela Copa do Brasil, na última quarta-feira, 08/02. A Macaca venceu o jogo, eliminou a equipe paraibana e Pottker marcou um gol. A questão é: sua participação na partida da Copa o impede de atuar pela equipe do Parque São Jorge nas outras fases da competição. O acordo fechado entre a Ponte e o Corinthians previa que Pottker se apresentaria ao Timão apenas após o fim do Paulistão. Até então, o Corinthians abria mão de contar com o reforço no estadual, mas não esperava ter de abrir mão do atleta também na Copa do Brasil que, junto ao Brasileirão, são os dois torneios de maior expressão que o time irá jogar no ano.    

Por fim, após confirmada a participação de Pottker no jogo contra o Campinense, o diretor de futebol do Corinthians. Flávio Adauto, veio à público antes da partida do time paulista contra a Caldense, também pela Copa do Brasil, confirmar o destrato no negócio. Disse ele: "A partir deste momento oficialmente a gente não toca mais nesse assunto. Tínhamos tudo praticamente decidido para ele se integrar ao elenco após o Paulista. Isso era um acordo, era conversado. Mas a Ponte Preta colocou o jogador em campo hoje... Consultamos às 16h, às 19h, e a Ponte no direito dela colocou o jogador para atuar, o Corinthians a partir desse momento esquece esse assunto, não fala mais de Pottker." O jogador, por sua vez, justificou-se dizendo que em momento algum o Corinthians comunicou o time campineiro da necessidade de não escalá-lo nos jogos da Copa, além de assumir postura extremamente profissional ao afirmar: "Não posso deixar de representar um clube que me paga e me ajuda. Tenho que manter o foco. Tenho que continuar fazendo o que vinha fazendo ano passado, porque se deixar de fazer, não vai ter interesse de mais nenhum clube. [...] Para dar um exemplo que todos vocês conhecem: o Gabriel Jesus estava acertado para ganhar milhões e mesmo assim não tirou o pé. Jogou com a mesma intensidade nos jogos. Se ele receberia milhões, ele continuou com intensidade, imagine o Pottker, que me desculpa, ganharia uma merreca perto disso, não é?"

A internet não perdoa.

No fim, podemos tirar algumas conclusões disso tudo. A primeira delas é a constatação da maneira amadora como o departamento de futebol do Corinthians vem conduzindo suas negociações. Não há como não traçar um paralelo com o caso Drogba, tão recente. A negociação frustrada com Pottker mostra a ineficácia do time alvinegro em conseguir reforçar o time após o desmonte pós-Brasileiro de 2015(em que se sagrou campeão) e a saída de Tite, além de presentear os rivais com infindável munição para zoeira - vide o meme Harry Pottker e o enigma de Drogba. A segunda é que nem sempre a chance de jogar em um clube gigante e receber alguns zeros a mais no contra-cheque supera o profissionalismo. Pottker, ao escolher permanecer na Ponte, passa o recado certo à outros jogadores, especialmente em tempos de inflacionado mercado chinês. De bônus, ainda ganhou de volta a idolatria da torcida da Macaca, que chegou a vaiá-lo após o anúncio da negociação e que agora, no treino aberto do último sábado, voltou a gritar seu nome. Por último, se o Corinthians tivesse real interesse na contratação do atleta, que agisse de maneira mais profissional, assinando o contrato, colocando as cláusulas que lhe interessasse e garantindo o reforço do jogador. 


Afinal, vendo o êxodo de jogadores brasileiros para mercados 'emergentes', mas de baixo nível técnico como Ucrânia, Russia, Índia e por último China, o sub-aproveitamento que as grandes equipes impõem às suas categorias de base e negociações amadoras estilo Corinthians/Drogba/Pottker, fica a indagação: nosso futebol é mesmo profissionalizado?