terça-feira, 29 de novembro de 2016

Quando o dia não termina.


6:48 da manhã. Não sei porque, hoje não precisei de despertador pra acordar. Cumpro o ritual cotidiano: agarro o celular que está a carregar na cabeceira pra checar o WhatsApp. 78 mensagens de 6 conversas. Algo de estranho aconteceu. Não é normal tamanha quantidade de mensagens enviadas de madrugada. Letárgico, começo a abrir os chats. A vista ainda embaçada apenas me permite vislumbrar algumas palavras soltas: avião, Chapecoense, desastre, 70 mortos....aos poucos, conforme o sono se vai e a incredulidade se instala, começo a entender o que aconteceu. Não teve mais ritual cotidiano, não teve café da manhã, não teve nada. Sentado fiquei, até perceber que se não saísse rápido, chegaria atrasado no trabalho. Nesse meio tempo, frenéticas vezes atualizava o facebook, a Globo.com, lia as mensagens que chegavam no WhatsApp, na vã esperança de que tudo fosse um engano, que logo o equívoco se esclareceria. Não foi. Confirmou-se a maior tragédia esportiva da história do país.

Ao longo do dia as informações iam chegando, desencontradas e trágicas. O time de ascensão meteórica, o xodó de todo torcedor brasileiro, estava dizimado. O jogo que nos preparávamos pra acompanhar e torcer na quarta-feira, eu e os amigos, não mais aconteceria. Foram-se multiplicando as homenagens ao redor do mundo. Craques de renome mundial como Beckham, Rooney, Casillas, Neymar, DeGea, Ronaldinho Gaúcho, Pelé, Maradona, Raul, Ballack, Schweinsteiger, dentre vários outros, postaram suas condolências. Nas redes sociais, a maioria das equipes brasileiras trocou seus escudos por brasões enlutados da Chape. Treinos de Real Madrid, Barcelona, além do jogo do Liverpool contra o Leeds pela Copa da Liga tiveram minutos de silêncio. A torcida do Copenhagen FC levou faixas de apoio no jogo de seu time hoje à tarde. O mundo esportivo, especialmente do futebol, se vestiu de luto.  

O time que conquistou a simpatia dos torcedores de todos os clubes

Ao mesmo tempo, gestos concretos de solidariedade começaram a surgir de todos os lugares: os times brasileiros comprometeram-se a emprestar jogadores a custo zero à Chape, assim como propuseram a imunidade do clube ao rebaixamento na série A nacional por três anos. O Libertad – PAR disponibilizou seu elenco, caso o time catarinense decida entrar em campo para jogar a final da Copa Sul-Americana, além da rodada de encerramento do Brasileirão. Mas talvez o gesto mais bonito tenha vindo do adversário que o time enfrentaria na final de amanhã. O Atlético Nacional de Medellín enviou solicitação à Conmebol - que, como em tudo que se envolve, ameaça atrapalhar - pedindo a declaração da Chapecoense como campeã da Copa Sul-Americana de 2016. Todos querem demonstrar seu carinho ao time catarinense.

Mas, e agora? Por enquanto, todos os jogos – a final da Copa, assim como os do Brasileirão e Copa do Brasil – foram adiados. A cidade que abraçou o time chora seus mortos. O mais importante nesse momento é cuidar dos sobreviventes, garantindo-lhes o pronto restabelecimento, e providenciar para que os familiares e a cidade tenham a oportunidade de dar adeus aqueles que tantas alegrias trouxeram nos últimos anos ao povo de Chapecó. São muitas histórias tristes, muitos corações arrebentados pela dor da partida que necessitarão de tempo para serem curados. Como estará a mulher do atacante Thiaguinho, que recentemente descobriu que seria pai pela primeira vez? O filho do técnico Caio Jr, que não embarcou com a equipe por ter esquecido o passaporte? A família do goleiro(e herói) Danilo, após saber que, mesmo tendo sido resgatado com vida, não sobreviveu aos ferimentos?   

O herói da classificação na semi-final deixa um filho de 2 anos

Diante de tanta dor, em entrevista ao Bom Dia Brasil, um emocionado presidente do Conselho Deliberativo, Plínio David de Nes Filho, disse que o sonho acabou. Foram as mesmas palavras utilizadas pelo fundador do time, Alvadir Pelisser, de 80 anos e que se recupera de um AVC sofrido em janeiro último. Mas eu, assim como todos os amantes do futebol, dizemos que não. O sonho foi apenas posto em espera. A Chape é gigante. Com a ajuda de sua magnífica torcida, dos clubes do Brasil e do exterior e de todo o mundo do futebol, temos certeza que o Índio Guerreiro de Condá dará a volta por cima. Exemplos não faltam, que o digam Brasil de Pelotas e Manchester United (este último também acometido por uma tragédia aérea em Munique, na Alemanha, no ano de 1958, que esfacelou uma das gerações mais brilhantes que o time já teve e que, dez anos depois, após intenso trabalho de recuperação, foi campeão da Champions League com o mesmo técnico da época do acidente, Sir Matt Busby, além do destaque e maior artilheiro da história do time até hoje, Sir Bobby Charlton, que também estava no avião acidentado).

É hora de juntar os cacos. Que a memória dos que hoje perderam a vida enquanto lutavam pela realização de seus sonhos e os sonhos de todo um povo, seja inspiração e exemplo para os que aqui ficaram. Que não esmoreçam diante da gigantesca batalha que se avizinha e que tenham forças para manter e elevar a Chape aonde ela merece estar.

O vestiário que dias antes presenciava uma festa, agora silencia



Como católico, rezo ao bom Deus para que acolha às almas dos falecidos, dando o conforto e consolo aos seus familiares.  



A equipe do blog deseja aos sobreviventes uma rápida e completa recuperação, assim como envia aos familiares e amigos de todos os envolvidos – jogadores, tripulantes e profissionais da imprensa – nossas mais sinceras e profundas condolências. Deseja ainda, por mais clichê que pareça, que cada um de nós saiba fazer do hoje o dia mais especial de nossas vidas. Que amemos e abracemos nossos pais, que digamos a nossos cônjuges o quanto são importantes para nós, que façamos o máximo bem possível enquanto podemos, tendo sempre em nossa mente a consciência da finitude do que chamamos vida.  


#forçaChape    


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